Manifestação não deve se confundir com violência

DEMOCRACIA, MANIFESTAÇÕES E VANDALISMO

Quando jovem, eu quis mudar o mundo. Dentro de uma redação, vivendo o dia a dia de um Governo militar que instituiu o terror no Brasil, procurei junto com muitos outros colegas mostrar o que estava havendo, burlando a censura – externa e interna – para que o leitor tivesse uma ideia do que acontecia na sua cidade, Estado e país. Vi a abertura e acompanhei, ainda como jornalista, a chegada da democracia no Brasil, uma mudança significativa para quem, como os integrantes de minha geração, viveram duas décadas sobre o regime cívico-militar que derrubou um Presidente legítimo e tomou o poder.

Sinto orgulho do que fiz, como cidadão e jornalista. E vejo, agora, que o que todos nós, à época, fizemos não foi em vão. Ver as pessoas na rua, defendendo posições, nos deixa recompensados. É preciso mostrar ao país que, ao contrário do que pregam os líderes do regime, não está tudo bem, que não nos conformamos, que ainda temos disposição para tentar mudar as coisas. Jovens e idealismo fazem a junção ideal para extravazar o que sentimos. Todos nós, por mais acomodados que estamos, sentimos algum incômodo com a situação da saúde, da educação, do trânsito e, sobretudo, da violência, que está se transformando em epidemia ou pandemia.

Os protestos são mais do que justos, embora tragam algumas reivindicações que são utópicas, mas isso é o fruto da juventude. O que vimos foram milhares e milhares de pessoas manifestando-se de forma pacífica e ordeira, externando uma insatisfação que não é só delas, mas que permeia se não a maioria uma grande parcela da população brasileira. E o melhor foi ver que não há uma concentração desta insatisfação, já que está espalhada por todo o Brasil e até pelo exterior, onde vivem brasileiros.

O único senão dos protestos – ou manifestações, como a queiram chamar – são os vândalos. Eles, pensando que estão contestando o regime, reivindicando mudanças, estão oferecendo a oportunidade de o Estado reagir e reprimir, encontrando motivos de desqualificar as centenas de milhares que foram às ruas e os outros milhões, que não foram, mas que os apoiam. Como defender a depredação do patrimônio público e privado? Como defender a violência gratuita do ataque contra policiais que eram apenas espectadores? Claramente, este pequeno grupo, que procura o confronto, querem provocar o tumulto e, com isso, desqualificar um movimento que se fez de modo ordeiro.

Reivindicar e protestar é próprio da democracia. Ela é, por sinal, o único regime que aceita ser contrariado. Não que goste. Mas é da essência do regime viver de ponto e contraponto, respeitando a opinião de quem não concorda. Manifestá-la, então, é um direito. E é para mostrar este direito que, entendo, milhares foram às ruas. Os vândalos, os provocadores, não estão interessados na democracia, não querem ver mudanças, de verdade. O que pretendem é criar o caos, provocar confusão e, com isso, tirando o foco do que realmente importa: o desejo de mudança de uma juventude que, ao manifestar-se, torna-se porta-voz de milhões e milhões de concidadãos.

A questão, no final, é: a quem eles servem? À democracia, certamente, não é. E também não visam à mudança, pois o confronto não leva a ela. Não sei qual é o propósito político destas pessoas que, de modo mais do que evidente, destoam da grande maioria. O que sei é que as manifestações são legítimas. E os vândalos, ao procurarem o confronto e partirem para o quebra-quebra, estão, ao mesmo tempo, buscando desqualificar a manifestação e o desejo de mudança de todos nós.

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